segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Mais riscos sob duas rodas

Correio Braziliense
Segundo levantamento do DETRAN, em 2009, um terço das colisões com mortes nas vias do Distrito Federal envolveram motociclistas
    As chances de quem trafega de moto nas vias do Distrito Federal se envolver em acidente com morte é quatro vezes maior do que para quem circula em automóvel. Estudo a que o Correio teve acesso com exclusividade revela que as motocicletas estiveram envolvidas em um terço de todos os acidentes fatais ocorridos no DF no ano passado. Vítimas da própria imprudência ou da irresponsabilidade alheia, 134 pessoas perderam a vida em 127 ocorrências envolvendo esse tipo de veículo.
    Os detalhes sobre os acidentes e o perfil dos envolvidos nas batidas estão no Informativo nº 5 do DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO (DETRAN), que acaba de ser concluído e reforça as suspeitas dos dirigentes dos órgãos de que as motos têm feito mais vítimas fatais, enquanto as colisões envolvendo outros veículos apresentam queda. O perfil do motociclista que morre e mata no trânsito traz duas revelações capazes de explicar o crescimento das tragédias: dos 131 motociclistas envolvidos em acidentes fatais, 28, ou 21,4%, não possuíam carteira de motorista. Já entre os 87 motociclistas mortos no local do acidente, 37 foram submetidos ao exame de alcoolemia pelo Instituto de Medicina Legal (IML) e 18 (48,6%) estavam alcoolizados.

    Passados um ano e sete meses da morte do jardineiro Raimundo Couto Ribeiro, 56 anos, a família ainda não obteve uma resposta sobre as causas do acidente ocorrido em 30 de abril de 2009, na BR-040. O filho dele, Sérgio Couto Ribeiro, 30, conta que pai sempre foi muito cauteloso, o que o faz duvidar da versão apresentada pelo homem que conduzia o ônibus que colidiu com a motociclista conduzida por Raimundo. "O motorista disse que o meu pai jogou a moto na faixa da direita, na frente do ônibus, depois de receber luz alta de um carro. Meu pai era medroso e nunca andava na faixa da esquerda porque dirigia devagar", ressalta.
    A morte de Raimundo angustiou ainda mais a mãe do rapaz, que se preocupa com o fato de ele ir ao trabalho de moto. "Explico que não tenho alternativa. Ir de ônibus demora demais e, de carro, a despesa com combustível é muito alta", justifica o morador de Santa Maria, que trabalha em Ceilândia. A rotina sobre duas rodas já imprimiu em Sérgio algumas lições. Ele evita sair ou voltar do trabalho em horário de pico. E, nas proximidades de retornos, nunca confia nos motoristas. "Se é um carro, o motorista que está no retorno espera. Mas se é moto, ele segue e você, se quiser, que pare", reclama. Mas o desrespeito não é só da parte dos motoristas de veículos. "O maior erro do motociclista é fazer o "corredor" e ainda trafegar em alta velocidade. Se o carro mudar de faixa, já era. Mas tem muito motoqueiro que não aprende", lamenta.
    As estatísticas mostram que a cada quatro dias e meio um motociclista morre no Distrito Federal e outros 44 ficam feridos em acidente com motos. O estudo do DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO (DETRAN) revela que dos 131 motociclistas envolvidos em acidentes fatais, 87 morreram (66,4%) e, destes, 37 no local. O perfil das vítimas revela que os pilotos e os caronas são os mais vulneráveis: representam 78,4% das vítimas.
Recorde de mortes com motos    Segundo o DETRAN, crescimento da frota, falta de fiscalização e imperícia são algumas das razões para o aumento das mortes.
    A cada três dias um motociclista se envolve em acidente com morte no Distrito Federal. Dados preliminares do DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO (DETRAN) revelam que 2010 nem terminou mas já é o mais violento dos últimos seis anos, em se tratando de colisões e mortes envolvendo motos. Entre janeiro e outubro,131 acidentes resultaram na morte de 96 motociclistas, o que representa um crescimento de 22% e 19%, respectivamente, se comparado com o mesmo período de 2008, quando ocorreram 109 acidentes fatais com moto e 77 motociclistas perderam a vida. Nos últimos anos, a análise dos acidentes com motociclistas revela tendência de aumento e nem assim as autoridades conseguem conter o avanço. Os estudos do próprio órgão revelam que a causa para as tragédias é, na verdade, uma combinação de fatores: o crescimento acelerado da frota, a falta de fiscalização, a imprudência e a imperícia do motociclista. Para se ter uma ideia, em uma blitz realizada na noite da última terça-feira, o DETRAN apreendeu 96 motos. Metade dos condutores (48) não era habilitada e quatro estavam sob o efeito de álcool. O restante circulava sem os documentos de porte obrigatório, como Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV ).
    O que dá um certo alívio às autoridades de trânsito é a redução das estatísticas entre outubro e 21 de novembro. Depois de agosto ter alcançado a marca de mês mais violento dos últimos 10 anos, com 21 acidentes fatais com motos e 22 mortos, setembro teve 12 e 13 ocorrências, respectivamente, e outubro fechou com oito acidentes e oito mortos em ocorrências envolvendo motocicletas. Novembro também deve seguir a tendência de queda pois, até o dia 21, foram registrados três acidentes fatais e três mortos.
Fiscalização intensa    Na avaliação do diretor-geral do DETRAN, Francisco Saraiva, a queda dos números se deve à intensificação da fiscalização. Equipes extras foram formadas com a convocação de agentes que ocupam cargos de confiança e foram incluídos nos grupos que organizam e realizam blitzes nas vias do DF. "Também colocamos equipes de plantão nos pontos considerados críticos e as estatísticas já revelam que nesses lugares não houve acidente fatal. É a prova de que estamos certos quando defendemos a necessidade de mais agentes", destaca.
    Presidente do Sindicato dos Motociclistas Profissionais de Brasília (Sindmoto), Reivaldo Alves concorda que muitos condutores são imprudentes e cobra do governo - DETRAN e Secretaria de Transportes - rigor na punição e mais campanhas educativas. "Se o governo fiscalizasse, não tinha tanta gente matando e morrendo. A partir do momento em que o governo investir em blitzes, vai reduzir os gatos com feridos nos hospitais", acredita.
    Reivaldo aponta outros dois caminhos para conter as mortes provocadas por acidentes com moto: curso de pilotagem e direção defensiva para motociclistas profissionais e mudanças na formação do condutor de motos. "Hoje, a pessoa tira carteira de moto sem dirigir no trânsito. O teste é em um circuito fechado. Apesar da mudança na lei, que determina que as aulas sejam no trânsito, isso não tem ocorrido", destacou.
    De acordo com o sindicalista, no Distrito Federal pelo menos 46 mil pessoas usam a moto para trabalhar e, desses, 18 mil estão cadastrados no sindicato. Atualmente, 840 motociclistas ligados ao Sindmoto estão concluindo um curso de pilotagem e a meta é formar 2 mil. As aulas estão sendo realizadas graças a uma parceria com o governo federal, que destinou R$ 2 milhões para a formação desses profissionais. "Queremos diferenciar o motociclista profissional do usuário comum com o uso do colete, placa vermelha, faixa refletiva no capacete, no baú e com a instalação da antena anti-cerol. Para isso, precisamos que as autoridades nos deem condições para cumprir a lei", cobrou.
OBRIGATÓRIO    É obtido quando o proprietário do veículo paga e recebe o Licenciamento Anual de Veículos. O documento deve ser renovado anualmente, sendo de porte obrigatório para todos os proprietários de motos, carros e caminhões.
Quase 5 mil feridos em 2009    No ano passado, os acidentes com moto deixaram 4.586 pessoas feridas, média diária de quase 12 pessoas. Em 18 anos de profissão, o mototaxista Luiz Carlos Garcia Galvão, 43 anos, escapou da morte duas vezes. O primeiro acidente, em 1997, rendeu uma fratura no fêmur da perna direita, seis meses de recuperação e uma sequela leve: passados 13 anos, ele ainda não consegue dobrar direito a perna.
    Há cinco anos, ele se envolveu na segunda colisão, esta mais grave. A batida deixou Luiz Carlos em coma na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) por 18 dias e a recuperação completa demorou oito meses.
    A gravidade dos acidentes não foram suficientes para afastá-lo do trabalho sob duas rodas. Mas os motivos das colisões lhe renderam lições importantes. Galvão assume total responsabilidade pelo primeiro acidente. Diz que estava distraído conversando com um amigo que dirigia o carro ao lado. "Os veículos da frente pararam no quebra-molas e eu bati em um Gol. Senti muita dor. No segundo, fui vítima da irresponsabilidade de um motorista. Caí e bati a cabeça no meio fio. O capacete rachou e o meu cérebro inchou muito. Em cima daquela maca, fiz minha qualificação profissional. Mudei meu pensamento e minha forma de conduzir a moto", diz.
    Hoje à frente de um sindicato, Luiz Carlos luta para conscientizar os profissionais mais jovens. "Quando eu comecei, não havia ninguém para me mandar para uma sala de aula.
    Hoje, lutamos para preparar os novatos para a condução segura", defende.
MAIS SEGURANÇA    Em julho, o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) editou a Resolução nº 356, estabelecendo requisitos de segurança para o transporte remunerado de passageiros e de cargas em motocicletas. A norma do CONTRAN regulamenta a Lei nº 12.009, que trata do exercício das atividades de mototáxi e motofrete. Segundo a norma, para exercer a atividade, o profissional deverá registrar o veículo na categoria aluguel no Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN). Para efetuar o registro, os veículos devem estar dotados de equipamento de proteção para pernas e motor, aparador de linha e dispositivo de fixação permanente ou removível para o passageiro ou para a carga.

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